“Não queremos ser ingleses. Queremos ser africanos governados por africanos, mas dentro do Império Britânico, com as nossas instituições preservadas.”
– Nana Sir Ofori Atta I, Omanhene de Akyem Abuakwa (1912-1943)

Em 1919, quando a elite educada da Costa do Ouro (actual Gana) criou o National Congress of British West Africa (NCBWA), sonhava com uma federação pan-africana ocidental, abolicionista do sistema de indirect rule e defensora de eleições directas para os conselhos legislativos. Um homem, porém, ergueu-se contra essa visão: Nana Sir Ofori Atta I, um dos mais poderosos e respeitados chefes tradicionais da colónia britânica.

Este artigo conta a sua história – uma história que ainda hoje divide opiniões entre quem o vê como traidor do nacionalismo e quem o considera o maior defensor da identidade e da autonomia africana no período colonial.

Quem Foi Nana Sir Ofori Atta I?

Nascido em 1881 em Kibi, no reino Akyem Abuakwa, Ofori Atta pertencia à dinastia real Asona. Educado em escolas missionárias basileenses e depois em Londres, regressou à Costa do Ouro com uma visão rara: combinar a tradição akan com a modernidade ocidental sem perder a soberania cultural.

Em 1912, com apenas 31 anos, foi entronizado como Omanhene (rei-paramount) de Akyem Abuakwa – um dos estados mais ricos e organizados da colónia, famoso pela produção de cacau e pela solidez das suas instituições tradicionais. Tornar-se-ia o primeiro africano a receber o título de Knight Commander of the British Empire (KBE) em 1927, mas nunca deixou de usar o seu poder tradicional para desafiar o colonialismo quando este ameaçava os seus súbditos.

O Surgimento do NCBWA e o Choque de Visões

Em 1920, o NCBWA, liderado por figuras como Joseph Casely Hayford, Thomas Hutton-Mills e J. E. K. Aggrey, reuniu-se em Accra e apresentou uma petição histórica ao Rei George V pedindo:

  • Eleições directas para o Conselho Legislativo
  • Separação do poder executivo e judicial
  • Abolição do indirect rule
  • Criação de uma universidade na África Ocidental

Para os chefes tradicionais, isso era uma ameaça mortal. O sistema de indirect rule britânico dava-lhes poder real: controlavam tribunais nativos, impostos, terras e até forças policiais locais. O programa do NCBWA parecia querer substituir esses reis e chefes por advogados e jornalistas educados no Ocidente.

Nana Ofori Atta tornou-se a voz mais poderosa contra o Congresso.

A Resposta dos Chefes: A Confederação dos Estados Costeiros

Em 1925, Ofori Atta fundou a Confederação dos Estados Costeiros (mais tarde Joint Provincial Council of Chiefs) e, em 1926, liderou uma delegação de chefes a Londres para apresentar o seu próprio memorando ao governo britânico.

Os pontos principais eram revolucionários à sua maneira:

  • Manter o indirect rule (mas reforçado e com mais autonomia financeira)
  • Criar um Treasury Nativo controlado pelos chefes
  • Dar aos Provincial Councils of Chiefs o direito de veto sobre leis que afectassem terras e costumes
  • Rejeição total das eleições directas (consideradas “estrangeiras à tradição africana”)

Curiosamente, os britânicos aceitaram quase tudo. Em 1927 foi criado o Native Administration Ordinance, que deu aos chefes o controlo das finanças dos seus estados – um poder que duraria até à independência.

Porquê Tanta Oposição ao NCBWA?

Ofori Atta não era um simples “colaboracionista”. Ele acreditava genuinamente que a elite educada do Congresso (muitos deles advogados da costa, descendentes de antigos mercadores de escravos) não representava o povo rural, que falava akan, ga ou ewe, e não inglês.

Num discurso famoso em 1926, disse:

“Estes senhores de fato e gravata querem transformar-nos em ingleses de pele preta. Nós já temos uma civilização milenar. Não precisamos de copiar a vossa.”

Ele via o NCBWA como uma ameaça à ordem social akan: o sistema de abusua (clã matrilinear), o papel dos asafo (companhiass militares tradicionais) e a autoridade dos ɔmanhene seriam destruídos por um parlamento ocidentalizado.

O Legado Controverso

A história oficial do Gana (especialmente após a independência em 1957) tende a pintar Ofori Atta como reaccionário. Kwame Nkrumah, líder do CPP e primeiro presidente, chegou a chamar-lhe “o chefe que se vendeu aos ingleses”.

Mas a realidade é mais complexa:

  • Durante a sua chefia, Akyem Abuakwa tornou-se o estado nativo mais rico da Costa do Ouro.
  • Criou escolas, hospitais e tribunais modernos sem abrir mão do controlo tradicional.
  • Formou politicamente o seu sobrinho J. B. Danquah (futuro líder da UGCC e opositor de Nkrumah) e o seu filho William Ofori Atta (futuro ministro das Finanças do Gana).
  • A sua linhagem daria ao Gana três vice-presidentes e vários ministros – a famosa “dinastia Ofori Atta”.

Nana Ofori Atta e o Caminho para a Independência

Paradoxalmente, ao fortalecer as instituições tradicionais, Ofori Atta ajudou a criar uma classe política africana sofisticada que, anos mais tarde, lideraria a luta pela independência – mas por vias diferentes das do NCBWA.

Quando, em 1946, foi criada a Constituição Burns, os chefes conseguiram 6 lugares reservados no Conselho Legislativo – um reflexo directo do poder que Ofori Atta tinha construído.

Só em 1951, com a Constituição de Nkrumah, os chefes perderiam esse poder formal – mas nunca o prestígio cultural.

Perguntas Frequentes

P: Ofori Atta era contra a independência?
R: Não. Era contra a independência nos moldes do NCBWA (centralizada, ocidentalizada e anti-chefes). Defendia uma independência gradual, federativa, que preservasse os reinos tradicionais.

P: Porque é tão pouco falado hoje?
R: A narrativa nacionalista ganesa, dominada pelo CPP de Nkrumah, preferiu heróis “modernos” e “radicais”. Os chefes foram vistos como obstáculos.

P: Ele era realmente rico?
R: Extremamente. Em 1930, o seu estado tinha reservas de mais de £300 000 libras (valores da época) – mais do que muitas colónias britânicas pequenas.

P: Qual foi a sua frase mais famosa?
R: “We want to evolve on our own lines” (“Queremos evoluir segundo as nossas próprias linhas”).

Um Nacionalista de Outro Tipo

Nana Sir Ofori Atta I foi um dos maiores paradoxos da história africana do século XX: um homem condecorado pelo Império Britânico que, no entanto, derrotou politicamente a elite africana “progressista” do seu tempo.

Hoje, quando se discute federalismo, descentralização e o papel dos reinos tradicionais na África moderna, o nome de Ofori Atta volta à tona – especialmente em países como Gana, Nigéria ou Essuatíni, onde os reis ainda têm peso político.

Se queres saber mais sobre as raízes profundas da história africana – desde os primeiros passos da humanidade até às grandes resistências contra o colonialismo, passando pelos reinos antigos que moldaram o continente e pela partilha da África na Conferência de Berlim – continua a explorar o site.

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